Para ser um sucesso editorial

O projeto de pesquisa “A Produção e Difusão de Sucessos: o caso Cinquenta Tons de Cinza”, realizado no Cotuca¹, tinha como objetivo entender quais foram os motivos que levaram a mais recente série literária de sucesso a se tornar tão famosa em tão pouco tempo. Os motivos incluem análises de mercado e planejamento estratégico, uso de ferramentas de marketing, além da criação e imposição de comportamentos.

Os sucessos editoriais são planejados

É importante notar que os sucessos não se dão a partir do acaso, mas de intenso trabalho de planejamento e promoção. Você já ouviu falar do “Star System”? Ele é um método de criação, promoção e exploração de celebridades que surgiu no final do século XIX, mas que ganhou notoriedade quando passou a ser amplamente utilizado em Hollywood. Hoje, o Star System transcende o seu perímetro de atuação em Hollywood para adentrar a vida política, acadêmica, profissional e outras esferas da vida cotidiana.

No mercado editorial, ele corresponde, segundo a pesquisadora Luciana Salazar Salgado², à “promoção empresarial planejada de certos tipos de livro e de autores que escrevem, por encomenda, textos destinados a ser best-sellers, lançados em manobras que conjugam diversas mídias, com tiragens imensas e um grande trabalho de marketing”. No âmbito literário, o Star System está intimamente ligado ao conceito do marketing editorial. Mas quais são as principais estratégias desse circuito do marketing editorial?

A pesquisa de mercado e os padrões editoriais

Do ponto de vista das análises de mercado e planejamento estratégico, são utilizadas desde redes sociais a ferramentas como o Google Trends – que, basicamente, mede o volume de pesquisas por palavra-chave no Google — para descobrir quais os assuntos são populares no momento do desenvolvimento de um novo produto.

Buscas pelo termo “Fifty Shades of Grey” entre Janeiro de 2011 e Agosto de 2015 no Google.

Temas como o feminismo e a libertação sexual das mulheres vêm se popularizando nos últimos anos, incentivando a criação de conteúdo com grande potencial lucrativo em um mercado em expansão. O próprio Cinquenta Tons de Cinza é uma resposta a essa nova onda de empoderamento feminino, pois a trama nasceu de fanfics eróticas de Crepúsculo publicadas online pela própria autora E. L. James e que tiveram seus direitos de publicação comprados por uma das maiores editoras do mundo, a Random House, que pertence à multinacional de mídia alemã Bertelsmann.

Nos três anos seguintes à publicação do primeiro livro da série Cinquenta Tons de Cinza, foram lançadas outras cinco séries com roteiros extremamente semelhantes, o que deixa claro o seu poder de geração de lucro. Já no âmbito das ferramentas de marketing, há o uso massivo de pesquisas de mercado feitas, principalmente, por empresas especializadas em Business Data que coletam, analisam e planejam estratégias de promoção e venda desses produtos sob critérios como gênero, idade, orientação sexual e poder aquisitivo.

Do ponto de vista da imposição de comportamentos há a questão de que os livros hoje já ditam tendências de consumo, não tendo mais um caráter estritamente recreativo ou educacional e ganhando espaço como uma ferramenta de divulgação como acontece em Cinquenta Tons de Cinza, onde várias marcas como Apple e Audi são explicitamente citadas. Dessa forma, os livros tornam-se redes de disseminação de propagandas muito importantes para alavancar as vendas de produtos adjacentes a ele. Só o setor de produtos eróticos brasileiro, por exemplo, registrou um aumento de 28% nas vendas desses produtos no ano de lançamento do primeiro livro, segundo a Associação Brasileira de Empresas do Mercado Erótico Sensual.

Sucessos viabilizados pela concentração da comunicação e publicidade

A união entre mídia e publicidade é cada vez mais intensa. A maior parte dos monopólios midiáticos não focam apenas em um tipo de mídia, mas garantem sua influência em grande variedade de setores, como no caso da multinacional alemã Bertelsmann, que atua no setor televisivo, publicação de livros e revistas, serviços e impressão.

A Bertelsmann é dona da Random House (e de sete outras empresas de caráter midiático), uma das principais editoras da língua inglesa no mundo e responsável pela publicação do livro Cinquenta Tons de Cinza. Após a sua fundição com a empresa Pearson PLC, passou a ser o maior grupo editorial de livros do mundo. Já a adaptação cinematográfica foi produzida pela Focus Features, uma subsidiária da Universal Studios que é subsidiária da NBC Universal e que, por sua vez, é subsidirária da Comcast e o maior conglomerado midiático do mundo.

O fato de tanto o livro quanto o filme terem sido divulgados por empresas influentes criou canais de distribuição muito eficientes para que ambos atingissem tal sucesso em tão pouco tempo.

Loja da Amazon só com produtos relacionados ao 50 Tons de Cinza

É possível notar que há um circuito de promoção planejada dos sucessos editoriais, envolvendo a antecipação e aceitação de certos produtos culturais mas, também, a produção ativa da demanda pelas obras, a partir da difusão de um conjunto de valores, avaliações e produtos que promovem o interesse e o consumo por estes best-sellers. A concentração dos setores de comunicação e de publicidade e as relações da publicidade com a mídia permitem esse funcionamento do mercado, principalmente porque muitas empresas no ramo do entretenimento, como a própria Warner Bros., detêm o poder de vários meios de comunicação – como canais de televisão e editoras –, o que facilita a divulgação de seus próprios produtos, já que os veículos de informação também estão em seu poder.

* Hayssa Rodrigues é ex-aluna de Mecatrônica (concomitante noturno) do Cotuca. Atualmente é aluna de graduação em Ciências Econômicas na UFSCAR (Sorocaba).

¹ O projeto de iniciação científica foi realizado na disciplina de Geografia, sob orientação do Prof. André Pasti.
² A autora discute isso em sua tese de doutorado, defendida na Unicamp: SALGADO, Luciana Salazar. Ritos genéticos no mercado editorial : autoria e práticas de textualização. Tese (Doutorado). Campinas: Unicamp, 2007.

1 Comentário

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Editorial – 3ª edição – Conexão Cotucaresponder
abril 16, 2016 em 04:04 PM

[…] iniciação científica de nível médio de Hayssa Rodrigues, sobre a produção de sucessos editoriais, e de Ana Luísa Ruggeri, sobre a segregação nos espaços ocupados por […]

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