Cansaço, exaustão e estudo

 

Esse é um relato comum para a comunidade do Cotuca, com o qual muitos certamente podem se identificar. Mas até que ponto isso é normal? 

Reclamações de cansaço são comuns no dia-a-dia de muitas pessoas no mundo atual, inclusive entre os alunos do Cotuca, como mostram alguns tweets reproduzidos ao longo deste texto.

 

“Eu tenho muita dificuldade para me concentrar. Se eu passo 10 minutos em um exercício de matemática e não consigo resolver, começo a chorar, desabo completamente. E isso é algo novo para mim, começou com o Cotuca. Principalmente quando tem muita prova, ou muito trabalho para fazer, eu sofro bastante”, diz a aluna Camila Dionísio, do 2° Alimentos.

Entender as causas e os efeitos desse cansaço que sentimos pode ser importante para evitar problemas maiores e saber quando é preciso se preocupar de fato. A exaustão tem um lado físico e outro psíquico, segundo o psicanalista clínico Roberto Cardona, formado pelo Centro de Estudos em Psicanálise Clínica (WCCA). No caso da parte física, a pessoa começa a sentir um cansaço muito grande, vontade de dormir, de se afastar, sensações de ansiedade, angústia, entre outras. Já na parte psíquica, o ego (o “eu”) tenta se proteger contra o que ele não tem vontade, não tem desejo de suprir. Assim, começa o conflito pelo ego não querer aquilo, mas precisar fazer por ser uma obrigação. Nisso, começam as defesas clássicas, como a vitimização e, em seguida, a negação. Passada a fase da defesa, diz o psicanalista, começa a frustração do aluno, já que, se existe a demanda, existe a expectativa e, caso não seja atingida, sente-se a culpa.

varios-tweetsDesabafos de alunos nas redes sociais.

Os que mais sofrem com a exaustão são os alunos do período do noturno, já que muitos não apenas estudam à noite e de sábado de manhã, como também trabalham durante o dia. “O problema maior é sábado de manhã, quando os alunos estão muito cansados. Eles saem daqui [do Cotuca] às 22h30 de sexta e já têm que estar de volta às 7h30, ou antes disso. Dá para ver nitidamente o quanto eles estão cansados”, lamenta Fernanda Castro, professora de Biologia do colégio. “O cansaço dos alunos é muito perceptível, e dos professores, também”, conta a professora, “principalmente nas últimas aulas do período, independente de ser manhã, tarde ou noite”. Esse cansaço é o motivo, muitas vezes, pelo qual os alunos caem no sono em sala de aula. Para os professores, é difícil saber o que fazer, porque a função deles é também garantir que a turma toda preste atenção à aula. Luiz Salles, professor de Física, comenta sobre sua atitude nesses casos: “não vou punir o aluno porque ele está com sono, mas cada professor faz de um jeito”.

Neila Nucci, psicóloga que trabalha no Cotuca no Serviço de Orientação Educacional (SOE), afirma que o SOE não apresenta recomendações sobre quais atitudes os professores devem tomar caso algum aluno esteja dormindo em sala de aula, e conta que não é comum que cheguem ao setor reclamações de professores nesse sentido.

COMO LIDAR

A aluna Camila faz acompanhamento com psicóloga fora da escola, que a está ajudando a melhorar, mas conta que alguns professores também fazem a diferença, sendo abertos a conversar sobre isso, se preocupando em auxiliar e compreender os alunos.

Neila conta que considera muito bom que os adolescentes estejam procurando ajuda de profissionais da saúde. Segundo ela, antigamente, quem procurava ajuda era rotulado como “louco”. Hoje em dia, ainda existe um preconceito, mas muitos alunos falam por conta própria que querem fazer terapia, o que ela considera uma conscientização de que o estudante pode encontrar dentro de si os recursos para superar as dificuldades, sem vergonha.

O Cotuca não oferece dentro da escola um acompanho clínico de psicoterapia. No entanto, Neila afirma que a Unicamp disponibiliza o CECOM (Centro de Saúde da Comunidade), e muitos dos alunos do Cotuca estão procurando por esse recurso. Lembra também que o SOE tenta incorporar um pouco das preocupações nesse sentido, mas não serve como uma terapia.

Para cuidar da organização cotidiana dos estudos, a professora Fernanda dá um conselho: “existem muitos alunos que trabalham e vão bem no colégio, pois se organizam e na sala de aula estão prestando atenção, usam o tempo que estão na escola para aprender a matéria. Se você entende em aula o assunto, seu tempo de estudo vai ser menor e o de descanso, maior. É necessário aprender a otimizar isso”.

Mas, em alguns casos, os problemas são mais sérios e a identificação deles é muito importante. “Um diagnóstico é o primeiro passo do tratamento”, diz o psicanalista Cardona. “Às vezes, o estudante está com um acúmulo de tarefas, fisicamente esgotado, e o tratamento é dormir, se alimentar bem, tomar bastante água e descansar, bem simples. No entanto, pode ser uma patologia mais grave, como no caso de uma total dissociação do que o estudante deseja para si e do que os pais estão colocando para ele. Esse último caso é mais sério, pois não se trata apenas da escola, em si, mas de uma imposição que não é aceita pelo ego”, afirma o psicanalista. Nessa situação, é necessária a consulta com o profissional da área de saúde.

Cardona também ressalta que, na adolescência, existem muitos outros fatores que geram exaustão, como o conflito do “o que eu vou ser quando crescer”, a sexualidade, a pressão de se socializar com amigos, além da própria cobrança da escola. Como hoje em dia a carga horária dos alunos é muito grande, especialmente no caso de colégios técnicos como o Cotuca, uma grande parte do tempo de um estudante é passada na própria escola. Os amigos nas horas de diversão também são os da escola. A rotina dos alunos se resume em escola-casa, casa-escola, e não há mais, para os adolescentes, a válvula de escape que era o tempo lúdico de socialização sem relação com a escola. Por fim, o psicanalista levanta uma questão: “para que tanto tempo dentro da escola?”.

2 Comentários

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Fernanda Sanchesresponder
janeiro 20, 2017 em 06:01 PM

Acho que um fator que abala muito o psicológico de alunos do Cotuca é ter sido o melhor da sala em outras escolas e se deparar com um cenário onde é muito difícil se destacar e onde o esforço que no fundamental rendia notas 10 agora não é suficiente nem para passá-lo de ano…
Além de que no Cotuca a dificuldade em certas matérias é enorme quando comparada com a de outras escolas. É necessário estudar muito para essas matérias, e o aluno tem menos tempo para estudar e menos energia por estudar em dois períodos.
Acho que o nível de exigência do colégio é positivo quando pensamos na formação do aluno academicamente e pessoalmente, pois o ajuda a aprender a organizar o tempo e a se acostumar com uma carga pesada. Porém, para atingirmos resultados bons, esse nível de exigência deve ser acompanhado de professores que enxergam os alunos e avaliações coerentes.

Os desafios na escolha da carreira – Conexão Cotucaresponder
junho 25, 2017 em 12:06 PM

[…] texto “Cansaço, exaustão e estudo”, escrito por Luísa Cerri e Giovanna Flores podemos ver um pouco mais sobre esses […]

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