Nem uma a menos

No último dia 5 de Janeiro, me encontrei com diversas mulheres no Largo do Rosário. “Em plena quinta-feira”, eu pensei, “tantas pessoas se dispuseram a estar aqui!”. E me senti muito feliz de estar ali também, compartilhando aquele momento, me aproximando de um movimento tão bonito, vendo diversas mulheres unidas, pintando o rosto, fazendo cartazes, dando risada, entusiasmadas. Aquilo renovou minhas energias. Era minha primeira manifestação em grupo, como feminista: eu pintei o rosto também e me senti parte de todos aqueles coletivos que, até então, não conhecia.

Mas, em seguida, veio a voz das representantes desses grupos, para lembrar-nos do motivo daquela união, me lembrar que aquela não era uma festa, aquele era um momento de revolução por liberdade, contra uma chacina que ocorreu em pleno ano novo. Mais do que isso: era um momento de revolução contra um feminicídio.

Aquelas vozes desconhecidas me lembraram de um inimigo não tão desconhecido das mulheres: o menosprezo. Me fizeram lembrar que o assassino do dia 31 de Janeiro matou 9 mulheres e propagou um ideal machista que foi bem aceito por muitos nas redes sociais, um ideal que está enraizado na sociedade, um ideal que mata. Me fizeram lembrar que, da mesma forma que a Isamara, vítima do dia 31, não foi ouvida ao fazer 6 denúncias contra o marido, milhões de outras mulheres também não são ouvidas pela sociedade. Me fizeram lembrar que uma onda conservadora está invadindo nosso país, e tal onda não quer discutir gênero nas escolas, nem representar os interesses das mulheres. A voz daquelas mulheres me lembrou que somos chamadas de vadias, somos culpadas por atos de violência em que somos vítimas. Aquelas mulheres me lembraram que a maior parte de nós já sofreu e/ou enfrentou algum momento de abuso ou opressão. Que somos ameaçadas a todo instante e que temos medo.

Mas, apesar disso, aquelas mulheres me lembraram que o feminismo é uma revolução, e que todas iriam lutar para que não tivesse “Nem uma a menos” no mundo. Como todas estavam lutando, naquele momento, pelos nomes de Isamara Filier, Liliane Ferreira, Alessandra Ferreira, Antonia Dalva, Abadia das Graças, Ana Luzia, Larissa Ferreira, Luzia Maia e Carolina de Oliveira. No momento em que entendi isso, eu entendi que não importa o quanto demore pra mudança acontecer, aquelas mulheres não vão desistir e eu decidi que também não iria. Por mais que minhas palavras feministas não sejam legitimadas pela sociedade atual em sua maioria, outras pessoas vão me ouvir, mulheres feministas e homens que apoiam o movimento, todos estarão juntos por uma mudança.

Eu entendo agora. Não importa o que me falem e o que eu sofra por ser feminista, essa ideologia já faz parte de quem eu sou, e, não lutar por isso, não lutar pela liberdade, não só minha, mas das mulheres ao meu lado e por uma sociedade livre do machismo, é um erro. Eu sei que a sociedade ainda apoia essa ideologia machista, que apoia até mesmo um assassino; uma sociedade violenta, que mata mulheres todos os dias, apenas por serem mulheres – e eu ainda temo isso, mas não vou me calar. Há essa luta nas ruas, de mulheres que não só espalham novas formas de repensar a sociedade no dia-a-dia, mas que vão pra rua, para ter voz e incomodar. Eu me identifico com essa luta agora e sei que não importa o que aconteça, eu não estou só: todas aquelas mulheres vão lutar por mim, e eu vou lutar por cada uma delas.

 

“Nem recatada, nem do lar, eu sou mulher e tô na rua pra lutar”

1 Comentário

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Selmaresponder
janeiro 24, 2017 em 10:01 PM

Parabéns pelo belo texto e pela disposição por uma luta que é de todas nós: em casa, na rua, no trabalho e na escola.

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